Roberto Irineu foi ao ar para dizer que os Marinho não vão abandonar a ambição de ser o grupo mais poderoso de mídia do Brasil. De continuar a exercer o poder político que o ambiente monopolista da radiodifusão lhe garante
23 de junho de
2017
Nesta
segunda-feira, 19 de junho, o Jornal Nacional foi um pouco diferente. A
inauguração das novas dependências e do cenário do JN deram um tom de
autocelebração ao noticiário noturno da Rede Globo de Televisão.
Um novo
estúdio, de 1370 m2, com 189 profissionais, 18 ilhas de edição, câmeras
robóticas, e toda uma parafernália tecnológica foi apresentada para tentar
convencer o telespectador de que o compromisso do Jornal Nacional e da Rede
Globo é com o jornalismo, com a “verdade” e com o Brasil. Tudo foi feito
“pensando em gente e a serviço da informação” diz a reportagem.
Para dar pompa
e circunstância à cerimônia eletrônica de inauguração, um púlpito no centro do
estúdio foi ocupado pelo mais velho dos herdeiros e atual presidente do Grupo
Globo, Roberto Irineu Marinho.
O diretor de
jornalismo, Carlos Henrique Schroder, disse que o Jornal Nacional “ajuda a
mudar a vida do brasileiro”. Taí uma verdade, o problema é que a mudança que
eles defendem e promovem não é para melhorar a vida de todos, ou não é mudar
para melhor. Nem precisamos buscar casos emblemáticos na história de 48 anos do
jornal para perceber isso. Basta olhar a posição do JN, hoje, sobre dois temas
fundamentais para “o brasileiro”: a Reforma da Previdência e Trabalhista.
A emissora dos
Marinho defende abertamente a aprovação do projeto que acaba com o direito de
os trabalhadores terem acesso à aposentadoria e do projeto que acaba com os
direitos trabalhistas garantidos pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
Levantamento da ong Repórter Brasil mostra que entre os dias 20 e 30 de abril,
77% das notícias do JN foram favoráveis à Reforma Trabalhista. Do total de 11
minutos e 8 segundos analisados, 2min31s “pode ser considerada desfavorável ao
projeto”. A reportagem em questão foi ao ar no dia da greve geral, 28 de abril,
depois de todo um dia de criminalização da luta dos trabalhadores.Acesse aqui
para ver o estudo da Repórter Brasil.
O presidente
do Grupo Globo, Roberto Irineu Marinho, num raríssimo caso de exposição da
família na emissora, defendeu suas empresas, a missão e os princípios que as
norteiam. Não mentiu, mas manipulou. Aliás, como muito bem nos ensinou o
jornalista Perseu Abramo em sua obra “Os padrões de manipulação da grande
imprensa” há quatro padrões principais utilizados pela grande imprensa para
manipular a informação: ocultação, fragmentação, inversão e indução. Os quatro
foram usados na “reportagem” e pronunciamento da Globo sobre a Globo, numa
tentativa – aparentemente desesperada – de reafirmar perante aos
telespectadores sua credibilidade, em meio ao que provavelmente seja a maior
crise que a emissora já viveu.
Roberto Irineu
Marinho reitera que o principal compromisso de sua família é a continuidade dos
negócios e dos “nossos princípios editoriais”. Em nenhum momento ele expõe
quais princípios sejam estes, mas pela sua história, trajetória e comportamento
a gente já sabe (defesa dos interesses de uma elite econômica, do estado mínimo
para garantir a ampla mão invisível do mercado, a redução dos direitos sociais,
muito dinheiro público para a iniciativa privada – particularmente para a
própria Rede Globo e, claro, o descaso com a democracia e o apoio a golpes para
garantir que os interesses anteriores sejam mantidos).
O presidente
das organizações Globo mostrou que não tem muita intimidade com o microfone e
com as câmeras. Fez uma participação sofrível no seu telejornal, mas passou de
forma enfadonha o recado político que queria: “Cuidar da saúde do grupo de
empresas e do exercício de sua missão e princípios para entregá-las saudável à
próxima geração que continuará a mesma tarefa. Somos e queremos continuar sendo
uma empresa familiar”, disse.
Roberto Irineu
foi ao ar para dizer que os Marinho não vão abandonar a ambição de ser o grupo
mais poderoso de mídia do Brasil. De continuar a exercer o poder político que o
ambiente monopolista da radiodifusão lhe garante.
E faz isso
agora, justamente, para tentar minorar os revezes (momentâneos ou não) que
sofreu no último período: a por enquanto frustrada tentativa de derrubar Michel
Temer, a perda da hegemonia na transmissão de jogos de futebol (seja dos
campeonatos regionais, seja da seleção), a perda de audiência, o fortalecimento
de novos grupos de mídia (Google, Facebook, Netflix e outros) que colocam em
xeque o modelo tradicional de negócios do Grupo Globo.
O momento é
delicado, para o Brasil e para a Globo
O Brasil
precisa reencontrar o caminho para restaurar a sua democracia, através da
soberania do voto popular; adotar uma política econômica que leve ao
crescimento interno e à geração de emprego e renda, com capacidade de
investimento público e garantia de direitos sociais e trabalhistas; recuperar a
política externa altiva e ativa que, combinada com a agenda interna, proporcione
o fortalecimento da nossa soberania nacional.
Já, o Grupo
Globo precisa, nas palavras de seu presidente, “preservar e garantir a
continuidade do nosso grupo de empresas”. Para isso, precisa trabalhar para que
o país aprofunde a agenda neoliberal na economia, com profundo ajuste fiscal,
redução dos investimentos públicos em áreas sociais e manutenção de uma
política de juros que alimente o setor financeiro, reduzir direitos
trabalhistas para ampliar a margem de lucro das empresas e precarizar as relações
de trabalho de forma a reduzir o chamado “custo Brasil”, investir na
desregulamentação da economia para manter privilégios e a concentração
econômica.
Nos 92 anos de
existência do Grupo Globo, iniciados em 1925 com a fundação do jornal O Globo,
praticamente não há um episódio sequer da história do país em que a posição da
família Marinho tenha sido tomada em prol da democracia, da liberdade, da
soberania ou da melhoria da vida do povo brasileiro. Pelo contrário, são 92
anos em defesa do poder econômico e da elite política conservadora. O Jornal
Nacional levou essa linha editorial para a tela da TV e ampliou de forma
avassaladora o poder da empresa. Não seria agora que eles iriam mudar de
posição.
Como disse
sabiamente o ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica, quando estamos perdidos
diante da conjuntura política olhe para a posição das empresas monopolistas da
mídia. Elas nos servem de bussúla. Se estão indo para o norte, então não há
dúvida, nosso caminho é para o sul.
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