Para o ex-governador de São Paulo Claudio Lembo, “há uma elite branca no país que não quer Lula de volta”; especialistas falam em massacre jurídico
05/07/2018
É do advogado
e ex-governador do Estado de São Paulo Claudio Lembo a frase que melhor define
o debate sobre o “massacre jurídico” que culminou na prisão política do
ex-presidente Lula. “Nunca vi nada tão imoral como o que acontece no Brasil.
Parece que Judiciário não tem apreço por nada, sobretudo pelos direitos
humanos. Há uma elite branca no país que não quer ver Lula de volta”.
Lembo era um
dos presentes no encontro “Capacidade Eleitoral Passiva: Lei da Ficha Limpa e a
Vontade Popular: Análise do Caso Lula e de Precedentes Jurisprudências”,
realizado nesta quinta-feira (28), em São Paulo, e coordenado pelo jurista e
ex-ministro da Justiça do governo Dilma Rousseff, Eugênio Aragão, e com organização do
Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo .
O apelo para
que as movimentações jurídicas tenham como aliado o apoio popular das ruas é,
segundo Lembo, a principal arma para enfrentar as manobras constantes do
Judiciário brasileiro, cujo exemplo mais recente foi o envio ao pleno do STF
(Supremo Tribunal Federal) mais um pedido de liberdade de Lula.”Neste cenário
macabro que estamos vivendo, é quase impossível achar que a constituição de 1988
ainda existe. Ela tornou-se secundária. Basta ver a questão da presunção da
inocência. A única forma de manter a luta é a movimentação social da população,
completa Lembo.
A defesa de
Lula hoje simboliza também a defesa da democracia do Brasil. É o que pensa o
jurista Celso Antônio Bandeira de Mello. “Se a democracia é um instituição que
deve respeitar a vontade do povo e todas as pesquisas colocam o ex-presidente
na cúpula dos votos então quem quer democracia só pode querer isso. Impedir ou
dificultar a campanha do homem que todos querem como presidente seria
antidemocrático. O mínimo de respeito com a democracia exige que o Lula pode
ser candidato. Não é que ele pode. Ele deve ser candidato”, enfatiza o jurista.
Mello também
usa o futebol para ilustrar a importância em ter Lula como um dos candidatos à
Presidência da República nas eleições de outubro: “Estamos disputando um
campeonato de futebol. E se o povo ficou feliz com a vitória da Seleção na Copa
do Mundo vai ficar mais feliz ainda quando o Lula for candidato e ganhar”.
Já para
Eugênio Aragão, é “a democracia que está sendo desafiada quando o Judiciário
atua de maneira preordenada” e que é um momento de muita perplexidade. “Peço
que os juristas que estão presentes tenham respeitabilidade e mantenham este
debate em evidência. A disputa jurídica deve ganhar capítulos ainda mais
calorentos daqui para frente. Por isso é fundamental levantar questões como
estão acontecendo aqui neste momento”, convoca o ex-ministro da Justiça.
O ex-ministro
destacou, ainda, a importância do trabalho da defesa do ex-presidente em um
processo de quebra democrática. Ele aproveitou o espaço para parabenizar a
atuação da equipe. “Gostaria de reforçar o esforço e o trabalho imprescindíveis
dos colegas, faço uma menção especial a atuação do ministro Sepúlveda Pertence,
por quem nutro a admiração do discípulo a seu mestre”. Ele falou sobre o pedido
de prisão domiciliar. ” O pedido é um esforço legítimo para atenuar as
restrições inconstitucionais a liberdade de Lula, ainda que não garantam o
óbvio, que é sua imediata soltura, como é devido. O trabalho do Ministro
Sepúlveda Pertence, em ação coordenada com os demais advogados de Lula, é
imprescindível para o sucesso da defesa em curso.”
Resistir é preciso
Fernando
Gaspar Neisser, coordenador adjunto e membro fundador da Academia Brasileira de
Direito Eleitoral e Político (Abradep) e do Instituto Paulista de Direito
Eleitoral, vê a situação do caso de Lula como “muito complexa porque choca não
só pela questão jurídica, mas também pela posição política assumida pelo
Judiciário”.
Dada a
dimensão do problema, explica Neisser, o caminho é disseminar todo e qualquer
ataque à Constituição e levar a batalha jurídica para todos os níveis
possíveis. “Nós estamos num momento da disputa da opinião pública em relação a
este tema que torna fundamental que os juristas levem este debate a público
tanto dentro quanto fora do Brasil. Não se pode admitir, por exemplo, uma
tutela de urgência que impeça a candidatura do ex-presidente Lula”, diz o
jurista, questionando o STF por submeter ao Plenário somente os processos
contra Lula.
A professora
de Direito Administrativo da PUC-SP Weida Zancaner completa dizendo que a luta
não pode se limitar ao terreno das leis. “As Ações Diretas de
Constitucionalidade (ADIs) tinham de entrar imediatamente em pauta, mas como
isso não tem ocorrido, eu duvido que o STF tenha boa vontade para julgar. Temos
que nos municiar juridicamente, mas sem o apoio massivo da população nas ruas,
a luta será muito mais difícil”, afirma a professora, referindo-se às ações
sobre a constitucionalidade da prisão provisória após condenação em segunda
instância, que estão prontas para serem votadas no STF mas não colocadas em
pauta pela presidente da corte, ministra Cármem Lúcia.
O professor de
Direito da Unesp Antônio Alberto Machado concorda. “Resistência é só o que
sobra. Primeiro: resistência jurídica como tem feito os advogados do
ex-presidente e todos os que concordam que há uma série de problemas todo o
processo. Depois resistência nas ruas, pois todas as pesquisas confirmam que
Lula tem a maioria dos votos dos brasileiros”, avalia.
Sindicato dos Advogados de SP
Dentro do jogo
de manobras políticas imposto sobre o caso de Lula, o advogado e professor de
Direito Constitucional da PUC-SP Pedro Serrano critica a Lei da Ficha Limpa:
“Esta lei neste momento está sob um forte paradigma autoritário que vem
paramentado por critérios de justiça. A soberania popular está sob ataque no
mundo todo e o caso do Lula se coloca como uma oportunidade para haver uma resistência. ainda temos total
condição de agir e retroagir porque temos demonstrado resistência desde o
início”.
Serrano
questiona se, caso a lei prevaleça e a candidatura de Lula se confirme, seria
possível manter um candidato preso. “Me parece que não. Acho que deveria
automaticamente se conceder a liberdade. Se começarmos a admitir este tipo de
processo para condenar pessoas poderemos entrar numa era da barbárie”, explica.
Além do apoio
das ruas, o jurista Pietro Alarcon aposta na “internacionalização” do debate
sobre o caso de Lula para se fazer valer a lei. “Do ponto de vista nacional
considero que é preciso insistir na necessidade de que o STF de uma saída a
questão. Nós ainda não esgotamos esta chance de que o STF ainda escute as
nossas argumentações. No campo internacional nós não temos sido suficientemente
habilidosos em fazer uma unidade de seguimentos jurídicos que possa nos ajudar
muito de maneira incisiva na questão brasileira. Temos que construir um
movimento jurídico internacional não em favor de uma pessoa, mas em defesa do
estado democrático de direito”, defende.
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