POR FERNANDO
BRITO · 10/08/2019
Os jornais
anunciam uma intensa operação corporativa, ajudada por uma mobilização dos
grupos de ultradireita, para “salvar” Deltan Dallagnol de sofrer sanções na
terça-feira, quando se julgarão duas das oito representações contra ele no
Conselho Nacional do Ministério Público.
Pelo ritmo
acelerado que tomaram as revelações sobre seus abusos e violações, não creio
que se chegará lá em condições de promover o “abafa” que desejam, mas é
deprimente que tenhamos chegado a um ponto pior do que sugeria um filme
italiano dos anos 70, Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita.
Nele, um chefe
de polícia- interpretado pelo magnífico Gian Maria Volontè – assassina a amante
– Florinda, ainda, Bulcão – e o crime, embora evidente, não pode ser atribuído
a ele pelo fato de que, sobre um alto comissário policial, não se pode ter
suspeita.
Porque ele,
além do cargo, tem um enorme e reconhecido papel na repressão política:
“repressão é civilização”, diz o personagem intocável.
No nosso
enredo tupiniquim, o cidadão Dallagnol também está acima de suspeitas como
imune a investigações, não só pelo cargo mas, sobretudo, pelo papel político
que exerceu?
Se a mídia
brasileira estivesse disposta a tratar o assunto à luz do interesse público,
bastaria uma questão simples para esclarecer as dúvidas: se mensagens hackeadas
evidenciassem que uma concorrência era fraudada, poderiam prevalecer os contratos
que ela gerou?
O que está em
questão não é, é claro, o direito a sigilo absoluto em negócios públicos, como
é a atuação dos promotores e do juiz que representam o Estado em processos
judiciais. A discussão é se o integrante de uma corporação estatal goza de
impunidade absoluta diante das evidências de que se desviou – e muito – dos
seus deveres institucionais.
De outra
forma: se um procurador – e, amanhã, um juiz – pode fazer o que quiser, como
quiser, contra quem quiser, desde que seja em nome de uma “moralidade” que a tudo
justifica.
A situação não
é inédita, aliás, tem outro belo retrato cinematográfico em A Sede do Mal,
filme de Orson Welles, onde o capitão Harry Quinlan, apoiado em sua fama de
prender bandidos está livre para plantar provas, torcer a investigação e impor
a “sua” lei.
Mas como há,
até terça, 72 horas de agonia, ainda estamos longe de saber que o “abafa jato”
se consumará.
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