
(Foto: REUTERS/Adriano Machado)
"Que mais ele terá de fazer para que o percebam como
nefasto, inepto e contraindicado para governar o Brasil e seus
problemas?", questiona a jornalista Tereza Cruvinel
26 de junho de
2020
Por Tereza
Cruvinel, do Jornalistas pela Democracia
Colunista/comentarista
do Brasil247, fundadora e ex-presidente da EBC/TV Brasil, ex-colunista de O
Globo, JB, Correio Braziliense, RedeTV e outros veículos.
X-X-X
A nova
pesquisa Datafolha nos diz que, apesar dos 55 mil mortos e das agruras da
economia, da prisão do Queiroz e da aparição do trapaceiro Wassef, Bolsonaro se
mantém como o presidente dos 30% de apoio e é rejeitado por menos da metade do
país (42%). Perdeu apenas um ponto porcentual de aprovação, ficando com 32%.
Tanta complacência popular para com quem aduba a pandemia, ameaça a
democracia, está perdido na economia e
desmoraliza o país diante do mundo com sua ignorância e rusticidade traz a
pergunta: Que mais ele terá de fazer para que o percebam como nefasto, inepto e
contraindicado para governar o Brasil e seus problemas?
Como
compreender que 64% acham que ele sabia que Queiroz estava escondido na casa de
seu escudeiro Frederick Wassef, e que isso não tenha resultado em desgaste e
perda de apoio? Bolsonaro saiba mas, para 46%, não tem envolvimento com o
esquema de "rachadinha", embora empregasse a filha do Queirós em seu
gabinete. Ela já disse que devolveutudo o que ganhou. Era uma funcionária alugada para sorver
dinheiro público para o hoje senador. Os que acham que Bolsonaro participava do
esquema são 38%, inferiores, portanto, aos 42% que rejeitam seu governo.
Tanta
indulgência só pode ser explicada pela adesão cega de boa parte da população a
Bolsonaro, por um conservantismo e uma inflexão à direita que não supúnhamos
tão arraigada na sociedade brasileira, que embutem também complacência
moral. Falar da índole fascista e autoritária
de Bolsonaro, ou de seu despreparo, não parece fazer sentido para seus
apoiadores. O país ainda terá que sangrar mais para que uma parte compreenda o
significado de Bolsonaro na Presidência.
Bolsonaro
continua sendo o presidente mais rejeitado após 18 meses no cargo, batendo até
mesmo Fernando Collor, que confiscou o que tínhamos nos bancos ao tomar posse.
No Datafolha, ele é rejeitado por 44%, que se concentram no Nordeste, de forte
memória lulista, entre as mulheres (48 x 41% de rejeição masculina), entre os
mais jovens (só entre os de 16 a 24 anos ele alcança os 54% de rejeição), os
mais escolarizados (53% entre os de nível superior) e os de maior renda,
chegando a 50% na faixa de 5 a 10 salários-mínimos e a 52% entre os que ganham
mais que isso.
Já sabemos que
ele vem compensando as perdas nestes extratos sociais mais iluminados com o
crescimento entre os mais pobres. Ele chega a 33% entre as pessoas com ensino
fundamental e obtém 29% entre os que ganham até dois salários-mínimos. Mas é na
classe média baixa, aquela que foi gerada pelo crescimento e a ascensão social
dos anos Lula/Dilma, na época chamada nova classe C, que ele vem se ancorando
mais. Nessas camadas, que ganham de dois a cinco salários-mínimos, ele chega a
35%, mais que sua média nacional. É no que dá promover a ascensão
desacompanhada da educação política.
Já sabemos
também que o auxílio emergencial de R$ 600,00 tem contribuído muito para isso,
embora Bolsonaro e Guedes tenham proposto inicialmente R$ 200,00. O Congresso
bateu o martelo em R$ 500 e Bolsonaro colocou mais R$ 100 para não ficar para
trás. Agora, quando ele propõe mais três parcelas de R$ 500, R$ 400 e R$ 300, o
Congresso fará tudo para manter os R$ 600, mas ainda que consiga, ele é que
ficará com os louros.
Outro fato que
ajuda a explicar que Bolsonaro tenha passado quase incólume pelas adversidades
recentes que enfrentou - dos inquéritos do STF à prisão de Queiroz, passando
pela trapaça para ajudar na fuga de Weingarten - é a tática da transfiguração
que ele adotou. Ameaçado de impeachment e de ter a chapa cassada, e não tendo
encontrado apoio militar para uma aventura golpista, tratou de se distanciar
ficticiamente do filho e vestiu nova fantasia. Deixou de ir aos atos de
apoiadores há dois domingos, trocou Weintraub pelo técnico Decotelli na
Educação e agora discursa em favor do diálogo e da harmonia entre os poderes. E
segue firme na prática da velha política, entregando nacos do governo ao
Centrão, avançando com o estelionato eleitoral que, por ora, não incomoda
apoiadores.
Ninguém muda a
própria essência depois dos 60 anos. Bolsonaro continua sendo o mesmo, a
qualquer hora vai reencarnar sua
autêntica natureza autoritária e voltada para o confronto permanente.
Agora, porém,
está contido, sobretudo pela ação do STF, e prometendo autocontenção.
Preservando os 30%, com a ajuda da pandemia não verá as oposições exibirem ao
Congresso grandes manifestações por seu impeachment, que pelo visto, não
sairá. Crimes de responsabilidade há de
sobra mas o Congresso não marcha contra o humor da sociedade, onde predomina a
tolerância. A soma dos 32% de bom e ótimo com os 23% que lhe dão nota regular
resulta em que 55% dos brasileiros não estão interessados em interromper o
mandado de Bolsonaro.
Este é o
futuro médio que nos aguarda, pelo menos até o final deste ano perdido de 2020.
Que mais ele terá de fazer? Terá de fazer o país sangrar mais. Terá que nos
enredar por longo tempo na pandemia, assumindo o papel de epicentro dela no
mundo. Terá que nos levar ao isolamento global, precipitar o país numa recessão
sem precedentes, gerando uma situação social explosiva, em que seu afastamento
já não será remédio.
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