
(Foto: REUTERS/Dado Ruvic)
"É urgente encontrar a salvação, mas também é preciso que
Oxford faça acordo com um governo que subestimou a pandemia? Um governo que
despreza doentes e mortos e que agora pode pegar carona no grande feito do
século 21", escreve o jornalista Moisés Mendes
27 de junho de
2020
Moisés Mendes
é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor
especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.
X-X-X
O governo é
sustentado pela fúria de fundamentalistas religiosos, militares, negacionistas,
golpistas e aliados de milicianos.
Um ministro da
Educação era analfabeto e odiava índios e chineses, o outro é acusado de forjar
títulos e de plagiar textos acadêmicos.
Bolsonaro
debocha da ciência, o ministro do Meio Ambiente devasta a Amazônia, metade do
governo acredita que a Terra é plana.
A outra metade
não acredita que exista pandemia, o ministro das Relações Exteriores combate o
multilateralismo e a globalização, a ministra dos Direitos Humanos vê Jesus em
goiabeiras e não vê feminicídios.
Mas o Brasil e
a Universidade de Oxford aliaram-se na luta para produzir uma vacina que
salvará o mundo. Passaram por Oxford mais de meia centena de vencedores do
Prêmio Nobel e 27 primeiros-ministros britânicos.
A universidade
decisiva para a ciência, a razão e a inteligência do Renascimento, que combateu
o obscurantismo, que acolheu e protegeu intelectuais fugidos do nazismo, essa
universidade pode ajudar a salvar a reputação de Bolsonaro?
O país que
enfrenta a pandemia sem ministro da Saúde, em que o presidente da República
recorre à Justiça para circular sem máscara, em que todos os avanços
civilizatórios são destruídos por ações do governo, esse país está a caminho de
produzir a vacina contra a peste?
Bolsonaro, o
governante mais repulsivo do planeta, que só consegue se dirigir aos familiares
dos que morrem infectados se tiver a ajuda de um gaiteiro, o indivíduo que mais
adiante poderá ser julgado por uma corte internacional como genocida, esse cara
poderá sair dizendo que ele, a ciência e Oxford, nessa ordem, ajudaram a salvar
o mundo?
É um dilema
que não é só do Brasil, é da humanidade. É urgente encontrar a salvação, mas também é preciso
que Oxford faça acordo com um governo que subestimou a pandemia?
Um governo que
despreza doentes e mortos e que agora pode pegar carona no grande feito do
século 21.
Deveremos nos
envergonhar se a produção da vacina contra o coronavírus for associada, não à
Fiocruz e a seus cientistas, mas ao nome de um sujeito que fez pacto com a
peste e com a morte.
A vacina pode
ser produzida por Cuba, pela França, por Angola, pela Finlândia, pela
Transnístria, com ou sem Oxford, mas nunca poderia resultar de um acordo com o
Brasil da era Bolsonaro. É indecente.
Fiquem com os
outros parceiros que brigam contra a pandemia, e não com os que se aliaram ao
surto. O mundo tem mais de 200 países. Não é preciso que a vacina dependa do
Brasil.
Fujam da
armadilha do orgulho de mais uma farsa nacionalista que vai associar a
descoberta contra a peste às trevas bolsonaristas.
Não caiam na
arapuca oportunista da extrema direita de que só teremos a vacina se ela for
‘nossa’. Não sejam terraplanistas e oportunistas. Deixem os desatinos da
euforia verde-amarela para os fascistas.
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