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Thiago Gaspar
O trabalho de procuradores do MPF e juízes federais durou anos,
em cima de 28 ações penais. Entretanto, pelo menos 79 condenados conseguiram a
absolvição completa ou a redução da pena, nas instâncias superiores
Por: Messias
Borges | 04 de Agosto de 2020
Se o trabalho
da Polícia Federal (PF) para identificar, encontrar e prender os suspeitos,
além de recuperar o dinheiro, do maior furto a banco da história do Brasil foi
complexo, não seria diferente para o Ministério Público Federal (MPF) e para a
Justiça Federal no Ceará. Procuradores e juízes se debruçaram sobre a papelada,
por anos, para condenar 119 réus (alguns repetidos) ligados ao furto ao Banco
Central em Fortaleza.
As
investigações da PF resultaram em 28 ações penais na primeira instância. A
divisão foi a forma que as autoridades encontraram para dar celeridade aos
processos e julgar os núcleos conforme atuação. Os réus foram acusados de furto
qualificado, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, porte ilegal de arma
de fogo, uso de documento falso e extorsão mediante sequestro.
As penas
aplicadas pela 11ª Vara da Justiça Federal variaram de 3 anos a 170 anos de
prisão. Quinze anos depois, todos os processos já foram arquivados na Justiça
Federal. A sensação dos procuradores e do juiz Danilo Fontenelle, que
trabalharam no caso, é de "dever cumprido".
Mas os réus
recorreram às instâncias superiores. Pelo menos 24 dos condenados em primeira
instância conseguiram absolvição no Tribunal Regional Federal da 5ª Região
(TRF-5) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). E 55 tiveram a pena reduzida.
Os pedidos de
absolvição e de diminuição de pena das defesas se basearam principalmente em
uma concepção do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o crime de lavagem de
dinheiro, concedida na Ação Penal 470, que ficou conhecida como 'Mensalão'. O
Supremo entendeu que os réus não podiam ser condenados pelo crime em fatos
anteriores à definição de organização criminosa existir na legislação
brasileira, o que aconteceu apenas em 2013. O Brasil era signatário de um
acordo internacional denominado Convenção de Palermo, que definia a lavagem de
dinheiro como crime, mas os ministros a ignoraram.
Líderes
Antônio
Jussivan Alves dos Santos, o 'Alemão', cearense e apontado como um dos líderes
da quadrilha que furtou R$ 164 milhões do Banco Central, foi condenado duas
vezes pela Justiça Federal: a 49 anos e 2 meses de prisão, em um processo que
respondia por furto, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e uso de
documento falso; e a 80 anos e 10 meses, por lavagem de dinheiro. A pena total
era de 130 anos de reclusão.
Porém, a
primeira pena foi reduzida para 35 anos e 10 meses, no TRF-5. Já a segunda foi
anulada no mesmo Tribunal, e o STJ manteve a decisão, em outubro do ano
passado. 'Alemão' foi preso pela PF em uma loja de pneus, em Brasília, onde
morava, em fevereiro de 2008. As investigações apontam que ele se passava por
fazendeiro, usava o nome falso de Antônio Joaquim de Oliveira Paiva e investia
o dinheiro do crime milionário em propriedades nos estados de Goiás e Mato
Grosso.
'Alemão' teria
ficado com o maior valor do furto e ainda destinado R$ 10 milhões à facção
criminosa paulista Primeiro Comando da Capital (PCC). Em 2017, ele tentou fugir
de um presídio cearense, mas terminou baleado e capturado. Depois, foi
transferido a um presídio federal.
O cearense
convidou familiares e conhecidos do Município onde nasceu, Boa Viagem, para
participar da ação criminosa que os deixaria ricos - e marcados. Também foram
condenados na Justiça Federal a sua irmã Geniglei Alves dos Santos, a 'Loura',
a 160 anos de prisão pelo crime de lavagem de dinheiro, mas teve a pena
reduzida para 15 anos; e o seu primo Marcos Rogério Machado de Morais, o
'Rogério Bocão', condenado em dois processos a um total de 57 anos de prisão,
por furto, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e uso de documento falso,
que, por sua vez, teve as penas reduzidas para 35 anos de reclusão. Rogério
fugiu do presídio e até hoje não foi localizado.
Acima de
'Alemão' na hierarquia do bando, segundo o delegado federal Antônio Celso,
estavam três homens. Luís Fernando Ribeiro, o 'Fernandinho', paulista, teria
sido o financiador da construção do túnel de 75 metros que levava até a
caixa-forte do Banco, ao pagar cerca de R$ 800 mil. Mas não chegou a ser
condenado na Justiça, porque foi encontrado morto em Minas Gerais, em outubro
de 2005 (dois meses após o crime), depois de ser sequestrado em São Paulo e a
sua família pagar R$ 2 milhões para ele ser liberado. A principal suspeita
recaiu sobre policiais civis.
Davi Silvano
da Silva, o 'Véi Davi', mineiro, que seria o mentor intelectual do túnel, preso
em uma residência no bairro Mondubim, em Fortaleza, em setembro de 2005, junto
de quatro comparsas, na posse de R$ 12,5 milhões furtados. 'Véi Davi' foi
sentenciado a 47 anos de prisão, em um processo que respondia por furto,
lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e uso de documento falso, na Justiça
Federal. Mas teve a pena reduzida para 17 anos e seis meses, na instância
superior.
E Moisés
Teixeira da Silva, o 'Tatuzão', também paulista, que tinha esse apelido porque
era especialista em cavar túneis. Ele foi o último líder da quadrilha preso,
apenas em julho de 2009, em São Paulo. Fez implante de cabelo e uma cirurgia no
pescoço para passar despercebido e afirma que foi extorquido e perdeu R$ 1,5
milhão dos R$ 2,5 mi que lhe couberam. Foi condenado a 16 anos de prisão em um
processo por furto, formação de quadrilha e uso de documento falso e teve a
pena reduzida para 14 anos.
Sorrateiros
Alguns
acusados de ligação com o furto ao Banco Central passaram mais de uma década
foragidos e escaparam de diversas ações policiais, até serem capturados e
começarem a cumprir as penas. O cearense Adelino Angelim de Sousa Neto, o
'Amarelo', foi preso pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) ao sair de
bicicleta de sua residência, no Município de Paranoá, em agosto de 2018. Ele
foi sentenciado pela Justiça Federal a 18 anos de prisão, por lavagem de
dinheiro, e depois teve a pena reduzida para 16 anos.
Outras duas
prisões aconteceram no mesmo ano, em Boa Viagem, onde nasceu o 'Alemão'.
Raimundo Laurindo Barbosa Neto, o 'Neto Laurindo', outro primo do líder da
quadrilha, foi detido pela Polícia Militar do Ceará (PMCE) no dia 18 de
setembro de 2018. Ele afirma que foi extorquido por policiais civis de São
Paulo e perdeu quase R$ 1 milhão. A Justiça Federal o condenou com a maior
pena, 170 anos de prisão, por furto, formação de quadrilha e lavagem de
dinheiro; mas a instância superior reduziu para 17 anos.
Já Antônio
Artenho da Cruz, o 'Bode', foi capturado também pela PMCE, no dia 10 de outubro
seguinte. Ele foi condenado na primeira instância a 27 anos de prisão, por
furto, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, mas a pena terminou
reduzida para dez anos.
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