(Foto:
Lula Marques)
"Moro foi absolutamente parcial nos processos nos quais
atuou, em especial contra o ex-Presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores.
Foi um agente. E esta constatação se alinha com o recente convite para ser
consultor da empresa que administra os escombros da economia", diz a
jurista Carol Proner
1 de dezembro
de 2020
Doutora em
Direito, professora da UFRJ, diretora do Instituo Joaquín Herrera Flores – IJHF
...
Ainda sob
impacto das eleições municipais, quando o país busca decifrar o mapa das forças
políticas pós segundo turno, um personagem surpreender uma vez mais pela
capacidade de se reinventar e escapar dos crimes que cometeu contra país. Não
falo do filho do Presidente ou mesmo dele próprio, mas do ex-juiz, do
ex-ministro, agora advogado e consultor jurídico da própria empresa que ajudou
a destruir. Sérgio Moro escandaliza novamente ao aparecer como consultor da
Alvarez & Marsal, consultoria americana especializada em gestão de empresa
e que atuará na recuperação judicial da Odebrecht.
Escandaliza
para quem tem princípios, caráter. Mas, olhando o leque de opções do nefasto personagem,
que sonhou com a Presidência da República, as saídas não eram tantas. A querida
esposa Rô, cultivada nos círculos do Graciosa Country Club, em Curitiba, depois
de circular entre vips no eixo Rio-São-Paulo-BSB, agora sofre de enxaquecas e
ataques de pânico. E a carta na manga dos “States”, um prêmio de consolação ou
uma válvula de escape, já estava no horizonte do excelentíssimo quando largou a
carreira da magistratura. Esse efetivamente não é o maior problema. De um ponto
de vista jurídico-político, a indignação diante da conduta sem escrúpulos não
deve ser a única reação, mas sim o silêncio – das instituições, dos setores
nacionalistas, da imprensa, do Supremo Tribunal Federal – que paira diante dos
escombros provocados pela destruição da indústria da construção civil e da
cadeia de óleo e gás provocada pela Lava Jato. O acobertamento ou a
naturalização das ilegalidades cometidas por um punhado de procuradores que
favoreceram os acordos de cooperação em matéria penal entre órgãos (públicos e
privados) de outro país, por meio de relações obscuras e ilegais. Interesses
que vêm sendo desvendados como imperialistas, para ir direto ao ponto. E um
juiz que, como até capivaras do Lago Paranoá ou do Parque Barigui, na
“República”, sabem, foi absolutamente parcial nos processos nos quais atuou, em
especial contra o ex-Presidente Lula e o partido dos trabalhadores. Foi um
agente. E esta constatação se alinha com o recente convite para ser consultor
da empresa que administra os escombros, corroborando com o que todo mundo já
sabe e que foi brilhantemente exposto no “Livro das Suspeições”, organizado por
juristas do Grupo Prerrogativas.
Portanto, para
além do corrompimento funcional, ético, biográfico de um personagem que vem de
longe, dos tempos do Banestado, que foi treinado fora do país, para além das
implicações de responsabilidade, o que a “lição Sérgio Moro” traz para o Brasil
é a necessidade urgente de rever a forma como é feita a cooperação
internacional em matéria penal na área do combate à corrupção. O que grita para
nós é a forma como cedemos a nossa própria jurisdição à soberania de outro
país, e os prejuízos bilionários que mal sabemos, pois permanecem em sigilo nos
acordos de leniência. A França passou pelos mesmos problema e já está a caminho
de rever a legislação de combate à corrupção para que não vulnere interesses
soberanos. Outros países fazem o mesmo. E o Brasil? Ou estamos seguros de que
não existirão outros Moros e Dallagnolls em nosso caminho? Ou achamos que
efetivamente os EEUU são a polícia neutra do mundo?
O resgate da
soberania também significa evitar a extraterritorialidade em matéria de combate
à corrupção. Nossos problemas devem ser resolvidos internamente, pelas nossas
instituições, pelo sistema de justiça funcionando com respeito à legalidade,
sem arroubos de autonomia ilimitada e em consonância com as garantias legais e
o devido processo. Sérgio Moro já é sinônimo de traição nacional e isso nem ele
próprio faz questão de esconder.
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