(Foto: Agência Brasil)
"Moro cometeu todo tipo de
arbitrariedade na Lava-Jato porque só poderia ser arbitrário cometendo crimes.
Quebrou as empreiteiras, encarcerou Lula antes da eleição, foi cruel com presos
sem condenação, fez acordo com Bolsonaro, foi ministro da extrema direita",
escreve o colunista Moisés Mendes. "Mesmo como traste, não pode ser um
traste impune"
24 de março de 2021
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora
Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.
...
O show de Gilmar Mendes humilhando Kassio Nunes Marques e a revisão do
voto de Cármen Lúcia resgatam esperanças que andavam meio extraviadas. Mas não
encerram a prestação de contas da suspeição de Sérgio Moro.
Falta saber como ex-juiz pode ser enquadrado e responder a processos
pelos crimes que cometeu. Como disse Mendes, sem essa conversa fiada de que são
falhas de conduta ou delitos administrativos, desses que devem ser tratados por
corregedorias de órgãos corporativos.
Moro cometeu todo tipo de arbitrariedade na Lava-Jato porque só poderia
ser arbitrário cometendo crimes. Quebrou as empreiteiras, encarcerou Lula antes
da eleição, foi cruel com presos sem condenação, fez acordo com Bolsonaro, foi
ministro da extrema direita.
Agora, é empregado da consultoria paga para tentar salvar as
empreiteiras que ele mandou que fossem quebradas sem piedade.
Não basta que Moro seja considerado suspeito pelo que fez contra Lula em
articulação com Deltan Dallagnol, a direita e a extrema direita. Nem que tenha
sido chamado de novo até de analfabeto por Gilmar Mendes.
Sérgio Moro terá de se submeter aos ritos da Justiça, não como fazia com
seus réus na masmorra curitibana, ou o gesto de ontem do Supremo terá sido
incompleto.
O que há formalmente contra ele ainda é pouco. Queixas-crimes
apresentadas pelos Juristas pela Democracia e pelo Coletivo Advogadas e
Advogados pela Democracia, contra Moro e os procuradores de Curitiba, ainda não
deram em nada.
O que existe é uma investigação do TCU em torno das suspeitas de que sua
contratação pela Alvarez & Marsal pode ter sido ilegal, muito mais do que
antiética.
Depois há, na carona da investigação do TCU, uma decisão do juiz João de
Oliveira Rodrigues Filho, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de
São Paulo, que suspende os pagamentos da Odebrecht à Alvarez & Marsal.
O juiz quer saber qual é o papel de Moro como prestador de serviços da
consultoria. Que papel pode ter um ex-juiz na empresa que está tentando salvar
o que sobrou de uma megacorporação massacrada pela ação do próprio justiceiro?
A principal suspeita é a de que Moro deve ser uma figura de fachada
dentro da empresa, para que funcione como um chamariz para outros clientes. A
contratação é tão acintosa que ele e a empresa não se preocuparam, por soberba
e sentimento de impunidade, com a exposição do que seriam as suas reputações.
Mas a principal suspeita mesmo é a de que a prestação de serviços é um
acerto prévio envolvendo o juiz que quebra empresas e a empresa que salva as
empresas que o juiz quebrou. Não há como argumentar que isso possa ser normal
ou uma casualidade.
A Odebrecht não é a única corporação destruída pela Lava-Jato que a
consultoria agora assessora em planos de recuperação judicial. Também a OAS, a
Queiroz Galvão e a Sete Brasil são clientes da empregadora de Moro.
É uma aberração. Não há como imaginar-se que um delegado que investigou
uma empresa por contrabando possa depois ser um agregado legalizado da
consultoria que tentará salvar a contrabandista ou submetê-la a normas de
conduta consideradas éticas e legais.
Sérgio Moro é uma excrescência da Justiça produzida pela direita. Ele
nunca foi um juiz de elite, nem a turma agrupada na força-tarefa de Curitiba
era excepcional por suas qualidades.
Moro e Dallagnol eram apenas os mais aptos, porque sem escrúpulos, para a
tarefa que entregaram a eles. Era preciso caçar Lula, destruir as grandes
empresas nacionais e abrir a porteira para a volta de um projeto político de
direita patrocinado pela Globo, pela Fiesp e pelos bancos, depois de derrotas
consecutivas nas eleições.
Só o que não deu certo foi esse projeto tucano, que acabou produzindo
Bolsonaro. Mas até nisso Moro foi mais ousado do que seus padrinhos e seguiu em
frente, para completar o trabalho sujo. Talvez até por ser um sujeito
simplório.
Não conseguiu ficar ao lado de tucanos e bacanas da Avenida Paulista,
como seria o plano original, e se prestou a ser um subalterno malmandado de uma
família ligada a milicianos.
Sérgio Moro perdeu o apoio dos tucanos, virou inimigo dos Bolsonaros e
hoje é um traste de uma facção esfacelada da Justiça. Mas, mesmo como traste,
não pode ser um traste impune.
0 comments:
[ Deixe-nos seu Comentário ]
Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor