Bolsonaro
com Paulo Guedes e refinaria da Petrobras (Foto: Reuters)
"O governo Bolsonaro entra em uma nova etapa, a fase de
acelerar os ajustes neoliberais acompanhado pelo populismo eleitoral",
escreve Aloizio Mercadante
13 de março de
2022
Aloizio
Mercadante é economista, professor licenciado da PUC-SP e Unicamp, foi Deputado
Federal e Senador pelo PT (SP), Ministro Chefe da Casa Civil, Ministro da
Educação e Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação
...
Temos alertado
para os desdobramentos da guerra na Ucrânia na economia brasileira e a total
falta de planejamento, de gestão e de estratégia do governo Bolsonaro. Também
para o fato de que o tempo de conflito e a abrangência das medidas de
retaliação do Ocidente à Rússia determinarão a extensão do dano no Brasil.
O primeiro
grande efeito da guerra em nossa economia se materializou, esta semana, com o
anúncio pela Petrobrás de um novo aumento nos preços dos combustíveis, 18,8% na
gasolina, 24,9% no óleo diesel e 16,1% no gás de cozinha. A inflação, que já
atingiu 10,54%, será duramente impactada com novos aumentos na taxa básica de
juros, mais endividamento público, mais restrições ao crédito, inadimplência e
queda no nível de investimentos e na atividade econômica.
Como, desde o
golpe contra a presidente Dilma, e como consequência da Lava Jato, a Petrobrás
passa por um processo de completo esquartejamento, a empresa não tem mais
capacidade de cumprir o papel estratégico de contenção do impacto da variação
do preço internacional do petróleo no mercado interno. A Lava Jato e o projeto
Temer-Bolsonaro subordinaram a Petrobras aos interesses das 392 empresas
importadoras de petróleo e dos acionistas minoritários.
A Política de
Preço de Paridade de Importação (PPI) dolarizou o preço dos combustíveis no
Brasil e relegou a Petrobrás, que descobriu, nos governos do PT, o pré-sal - as
maiores reservas de petróleo do século 21-, a condição de empresa exportadora
de óleo cru. Por isso, neste momento crítico de forte alta dos combustíveis no
mercado internacional, a Petrobras não tem mais capacidade de atuar para
regular os preços dos derivados no mercado interno.
Da mesma
forma, a grave dependência das importações de fertilizantes, agravada pela
decisão do governo Bolsonaro de paralisar a construção de uma fábrica de
fertilizante pela Petrobras e a venda de outras três, ameaça a nossa produção
de alimentos. Como já dissemos anteriormente, Rússia e Belarus são responsáveis
por 28% das importações de fertilizantes. Os efeitos no milho, no trigo e na
carne de frango e de porco estão postos e colocam ainda mais pressão no custo
de vida, penalizando duramente os mais pobres. E dependendo da evolução e da
duração da guerra, poderemos ter uma grave crise no fornecimento de
fertilizantes com comprometimento da safra agrícola no futuro.
A verdade é
que as privatizações, a diminuição de carga de processamento e a redução dos investimentos
em refino levadas a cabo pela Petrobrás tornaram o Brasil dependente da
importação de cerca de 30% da gasolina, do diesel e do gás. Da mesma forma, o
cancelamento de projetos, o arrendamento de unidades e a redução de
investimentos fazem com que importemos
mais de 80% dos fertilizantes que utilizamos.
Agora, a
Petrobrás com menos força, sem a BR Distribuidora, sem a Liquigás, com apenas
metade dos navios petroleiros da Transpetro, sem os gasodutos, e refém da PPI,
que praticamente indexa o preço dos derivados do petróleo ao valor
internacional, não consegue mais reduzir sozinha o preço interno dos produtos.
Esse drama dá a medida da urgência que é recuperar a integração sistêmica entre
prospecção, exploração, produção, refino e distribuição da Petrobrás, bem como
a retomada de um plano de substituição de importações para os fertilizantes,
que assegure a soberania e a sustentabilidade alimentar.
Mas, à medida
que a situação econômica se agrava, o governo Bolsonaro entra em uma nova
etapa, a fase de acelerar os ajustes neoliberais acompanhado pelo populismo
eleitoral. Para tentar se viabilizar eleitoralmente depois da tragédia que tem
sido o desgoverno até agora, com menção especial à condução desastrosa da pandemia,
Bolsonaro adota uma política econômica que pretende acelerar as privatizações e
ao mesmo tempo, sem qualquer responsabilidade ou estratégia sustentável, arma
uma verdadeira bomba fiscal para o futuro governo.
Para ficar em
alguns exemplos, podemos mencionar a PEC dos Precatórios, com impacto de R$ 44
bilhões, e a pedalada no reajuste dos servidores. Há também o aumento de
despesas como o Vale Gás para 11 milhões de famílias, o reajuste de 10% no
salário mínimo, a ampliação da cobertura do Auxílio Brasil, a liberação de R$ 8
bilhões de contas inativas do Bacen, R$ 22 bilhões do FGTS, a anistia do Fies e
a abertura de mais de R$ 100 bilhões em linhas de crédito.
Algumas
medidas são necessárias, mas o foco são as eleições, por isso, permanece o
orçamento secreto e a pulverização de recursos públicos, em um cenário de
estagnação da economia e dos menores níveis de investimentos públicos das
últimas décadas.
Bolsonaro
poderá tentar alguma medida demagógica para segurar temporariamente e de forma
artificial o preço dos combustíveis. Estão em debate no Congresso Nacional
medidas que procuraram mitigar os aumentos, mas que deveriam utilizar a própria
cadeia produtiva do petróleo para constituir um fundo estratégico que permita
alguma regulação dos preços, como a tributação sobre as exportações de óleo cru
e a tributação dos dividendos e ganhos extraordinários da Petrobras, que vem
batendo os recordes históricos no pagamento de dividendos. Entretanto, essas
alternativas foram retiradas do projeto original no Senado e o que está
avançando é a retirada de recursos fiscais do orçamento público, incluindo
estados e municípios, para subsidiar os combustíveis. É inaceitável.
É evidente que
não podemos sacar dinheiro do orçamento para financiar o lucro dolarizado dos
acionistas privados da Petrobrás. Como já dissemos, o país enfrenta a menor
taxa de investimentos públicos em décadas, está com 12 milhões de desempregados
e 19 milhões de pessoas passando fome e atravessa uma tragédia na educação e na
saúde.
Ao mesmo tempo
que avança no populismo fiscal, Bolsonaro ameaça o setor elétrico com a
privatização da Eletrobrás. Se levada adiante, essa medida terá efeitos
dramáticos no setor, com a perda do poder de regulação do Estado, aumento dos
preços e a completa descoordenação do sistema elétrico. Será a repetição no
setor elétrico da lógica de finaceirização da energia e do caos que se instalou
na cadeia de petróleo e gás, a partir do desmonte da Petrobras.
Bolsonaro
tenta a todo o custo reverter o descalabro de três anos de retrocessos e de
desgoverno com medidas desesperadas de irresponsabilidade fiscal. Mas, a força
do legado dos nossos governos e a liderança de Lula, que ainda pulsam nas
“veias abertas” do povo brasileiro, derrotarão o governo da extrema direita,
agora acompanhado de populismo neoliberal. Temos muita luta pela frente, e dela
dependerá um projeto portador de futuro para o Brasil.
Brasil 247
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