(Foto: ABr)
Para Moisés Mendes, quando diz que não teme prisão, porque Deus irá
protegê-lo, Bolsonaro se imagina preso e se agarra ao imponderável. "É a
hora do desespero"
16 de maio de 2022
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora
Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.
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A certeza de Bolsonaro de que é um homem imune a condenações e prisões o
expõe como um sujeito atormentado pelo pesadelo do cárcere.
Um poderoso certo de que ficará livre e impune, apesar dos crimes que
sabe ter cometido, não fica repetindo que não teme a prisão, como ele disse
nessa segunda-feira.
“Até já falam que eu vou ser preso. Por Deus que está no céu, eu nunca
serei preso”, disse o pregador inseguro em evento no alto da colina da
Associação Paulista de Supermercados. O que ele pode der dito é que espera ter
apoio para não ser preso.
Apoio daqueles que estavam ali e o aplaudiram, dos que não estavam e
estão quietos, dos silenciosos da Fiesp, da OAB, de sindicatos, das chamadas
organizações da tal sociedade civil. As entidades não só de supermercados, mas
de gente de bem que vende bois, vacas, armas, juros, dólar e madeira e ouro das
terras dos índios.
Bolsonaro sabe que, se as leis que valem para os outros, principalmente
para pobres e negros, forem válidas também para ele, é quase certo que será
preso.
Mas conta com a blindagem que o protegerá. Não só dos militares e dos
milicianos. Bolsonaro tenta acreditar que, já na sarjeta, terá apoio de quem o
protege hoje, mesmo que precariamente.
O que procura negar, mais como autoengano, é que perdedores não têm a
proteção de ninguém. Se for derrotado, se ficar ainda mais alucinado depois da
eleição, Bolsonaro não será nada. Talvez seja menos do que um Queiroz.
Os que hoje o aplaudem, quando ele diz que os banheiros dos
supermercados não devem ser fiscalizados, vão largá-lo logo adiante. Nem Deus
do céu se interessa muito por quem perde força e poder.
Mas a questão está posta de novo, a partir da inquietação do próprio
Bolsonaro. As instituições serão capazes de levar adiante não só os processos
contra ele, mas contra todo o seu entorno? E têm força para mandar prender
fascistas?
As quadrilhas das vacinas continuarão impunes? Deus do céu vai proteger
também os que se organizaram para vender cloroquina e negar a ciência? E os
fabricantes e financiadores de fake news?
Os filhos de Bolsonaro, os militares citados pela CPI do Genocídio, as
milícias da família, os chefes das gangues do orçamento secreto, todos eles têm
a mesma certeza que Bolsonaro tenta transmitir, quando o que transmite mesmo é
o medo de ser preso?
Bolsonaro é um sujeito acionado por dúvidas, que avança uma semana e
recua na seguinte, que agride o Supremo e manda cartinha, que incentiva os
pregadores do golpe e de ilegalidades e logo depois desqualifica os defensores
do AI-5.
Deus do céu não protege quem vacila. Bolsonaro é um estudioso da Bíblia
e sabe o que Paulo disse na primeira epístola aos coríntios. Paulo disse: Deus
não permite que um homem seja tentado além daquilo que pode suportar.
Bolsonaro não consegue suportar o governo, não suporta a ideia de que
pode perder a eleição e pode não suportar o próprio plano de um golpe. Já sabe
que o medo de ser preso é apenas consequência de tudo o que nunca suportou.
Falta fé a Bolsonaro até para se imaginar em outro lugar que não seja o
cárcere. Quando diz a empresários que não teme a prisão, porque Deus do céu irá
protegê-lo, ele se imagina preso e se agarra ao imponderável. É a hora do
desespero.
Os empresários que ouviram seus gritos (dizem que nunca falou tão alto)
em São Paulo vão à missa, como todos os que têm Deus acima de tudo, mas
Bolsonaro sabe que eles não acreditam em Deus.
Eles não acreditam nem no que Bolsonaro fala. Só levam a sério o medo do
sujeito de ser preso. Os empresários enxergam Bolsonaro gritando agarrado às
grades de uma cela da Papuda.
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