(Foto: Instagram/Projetemos)
"O caos não é só o reajuste do preço
de combustíveis. O caos é sobretudo causado pelo presidente que não
trabalha", escreve Aloizio Mercadante
Aloizio Mercadante é economista, professor licenciado da PUC-SP e
Unicamp, foi Deputado Federal e Senador pelo PT (SP), Ministro Chefe da Casa
Civil, Ministro da Educação e Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação
...
18 de junho de 2022
Em meio a um novo reajuste no preço dos combustíveis, Bolsonaro declara
que “a Petrobrás pode mergulhar o Brasil num caos”. “Seu presidente, diretores
e conselheiros bem sabem do que aconteceu com a greve dos caminhoneiros em 2018
e as consequências nefastas para a economia do Brasil e a vida do nosso povo”,
prossegue. No mesmo sentido, o ministro-chefe da Casa Civil afirma que: “A
Petrobrás não é de seus diretores. É do Brasil”.
Em ambos os casos, o que se vê é a velha estratégia de tentar blindar o
governo das tragédias social e econômica que assolam o Brasil. Estamos chegando
ao fim do governo e eles são responsáveis diretos por nomear o conselho e a
diretoria da Petrobrás, bem como por manter a política de paridade
internacional de preços que começou logo depois do golpe e que eles nunca
enfrentaram.
A Petrobrás que descobriu o pré-sal, que estava substituindo
importações, que investiu em refino e na construção de fábricas de fertilizantes
e que estava se preparando para se tornar uma grande exportadora de derivados
foi esquartejada. O resultado é essa tragédia que aí está: uma empresa refém
dos interesses de grandes importadores de derivados e dos acionistas
minoritários. Uma empresa que teve o maior lucro entre todas as petroleiras do
mundo enquanto o povo brasileiro sofre com o preço abusivo dos combustíveis.
Sem propostas estruturantes para o setor, o governo Bolsonaro aposta na
redução da alíquota de ICMS sobre os combustíveis, que pode gerar, segundo
governadores e prefeitos, uma perda de até R$ 90 bilhões em receitas. Sem
contar que se trata de uma medida que não tem impacto sobre o óleo diesel, pois
ele já está na média com uma alíquota abaixo dos 17%. O que temos, na prática,
é uma proposta insustentável, que promove um estelionato eleitoral e deixa mais
uma bomba fiscal para o futuro governo.
Bolsonaro também avança com a privatização da Eletrobrás, uma empresa
com 60 anos de história. A Eletrobrás é indispensável para o planejamento
estratégico do setor e tem peso importante na geração de energia em um país
continental que tem um sistema elétrico integrado e grandes linhas de
transmissão. A Petrobrás e a Eletrobrás estatais, juntas, são decisivas para a
transição ecológica de uma economia sustentável, de baixo carbono e para a
transição de energia que o Brasil precisa impulsionar.
Ao mesmo tempo, a inadimplência bate recorde e atinge 66,1 milhões de
brasileiros em abril, uma ascensão vertiginosa. O Banco Central que vê a
inflação descontrolada, pressionada pelo custo dos alimentos, da energia e do
petróleo, aumenta a taxa de juros para 13,25% ao ano. É evidente que a nova
taxa da Selic agrava a fragilidade financeira do Estado. Os juros da dívida
eram de R$ 312 bilhões em 2020 e a projeção para este ano pode chegar a R$ 750
bilhões, a depender da evolução dos juros.
O custo da cesta básica cresceu mais que o dobro da inflação e atingiu a
desesperadora marca de 26,75%, esmagando os pobres e espalhando a fome, a
carestia e a insegurança alimentar. Dados publicados recentemente apontam que
mais de 125 milhões de brasileiros vivem em situação em insegurança alimentar.
Ou seja, não têm comida garantida todos os dias, nem em quantidade, nem em
qualidade. Desse total, 33,1 milhões passam fome.
Há universidades ameaçando paralisar atividades por falta de orçamento
para custeio. O mesmo no SUS. As demandas de saúde no pós-pandemia cresceram
muito e, com a crise, há uma parcela da classe média que está migrando dos
planos de saúde para o SUS. Com a falta de recursos, o país caminha para uma
situação dramática.
Não bastasse toda essa tragédia, vivenciamos estarrecidos, a barbárie do
assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom
Phillips. Já houve outros homicídios de grande repercussão internacional na Amazônia,
como as mortes de Chico Mendes ou da missionária Dorothy Stang, mas nunca com o
governo ao lado dos madeireiros, pescadores e caçadores ilegais, mineradores e
grileiros de terra.
Há na região um sistema extremamente complexo em que o governo da
milícia urbana é também o da milícia rural a serviço de um agronegócio atrasado
e predatório. Isso, em uma região dominada pelo tráfico de drogas, notadamente
de cocaína.
Não bastasse a brutalidade e a omissão que chocaram todo o mundo
civilizado e ampliaram a condição de pária internacional de Bolsonaro, Bruno e
Dom tiveram suas honras e suas memórias agredidas. Bolsonaro declarou que o
indigenista e o jornalista estavam em uma “aventura não recomendada” e que Dom
“era malvisto na região” por fazer reportagens contra garimpeiros. A mesma
postura sem escrúpulos com que tratou os mortos pela pandemia de covid-19
quando chegou a dizer que não era coveiro e chegou até mesmo a imitar pessoas
morrendo asfixiadas.
Para além do fracasso econômico, social e institucional, Bolsonaro vai
deixando, a cada dia, um rastro de agressões ao processo civilizatório do país.
A prova cabal é que, em meio às mortes de Bruno e Dom, chega ao absurdo de
programar uma “motociata” em Manaus. Nada mais desrespeitoso, com a dor das
famílias e do povo brasileiro.
Desesperado, Bolsonaro segue com o único recurso que ele sempre
defendeu: a ameaça de golpe. É o único presidente da história que defende a
tortura e o assassinato político à luz do dia. Mesmo quando as instituições
norte-americanas estão desvendando a gravidade da tentativa de golpe de Trump,
que foi acompanhada de perto pela família Bolsonaro, ele tenta reproduzir a
armadilha golpista da extrema direita mundial aqui no Brasil.
Portanto, o caos não é só o reajuste do preço de combustíveis
patrocinado pela omissão irresponsável de Bolsonaro. O caos é sobretudo causado
pelo presidente que não trabalha, que não se dedica e que não resolve os
problemas fundamentais do país. O caos é Bolsonaro.
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