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Pensar em sexo o tempo todo pode ser doença

Gostar de sexo e do prazer que ele proporciona é normal e faz bem à saúde. Pensar no assunto excessivamente e considerá-lo prioritário – a ponto de colocar em risco a própria vida, o trabalho ou a saúde de outras pessoas – pode ser uma doença. O alerta é do psiquiatra Marco Scanavino, responsável pelo Ambulatório de Impulso Sexual Excessivo do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), que acaba de iniciar seu primeiro grande estudo sobre o tema e está em busca de voluntários.
“Se a pessoa tem bastante apetite sexual, mas tem o controle de sua vida, honra seus compromissos e está feliz, ótimo. Agora, se a pessoa vive em função do sexo, isso deixa de ser saudável”, diz. O assunto, abordado por Scanavino durante a sétima edição do Congresso Brasileiro de Cérebro, Comportamento e Emoções, acompanhado pelo JT no mês passado, em Gramado (RS), é alvo de uma pesquisa planejada pelo Instituto de Psiquiatria do HC para conhecer melhor o universo desses pacientes. A ideia é avaliar no grupo possíveis sintomas, como depressão e ansiedade, além de alterações neuropsicológicas – como mudanças na atenção e na memória.
Podem participar do estudo homens e mulheres, com mais de 18 anos, que tenham comportamento sexual excessivo. O problema é que a sexualidade exacerbada, muitas vezes valorizada no Brasil, nem sempre é vista como um problema – mesmo quando traz sofrimento para o indivíduo. O universitário J. Alves, de 36 anos, por exemplo, não sabe exatamente se o que ele tem é um transtorno, mas reconhece não ter controle quando o assunto é sexo e tem consciência de que algo não está correto. “É como se fosse uma droga. Se eu sentir vontade e não fizer, bate uma coisa muito ruim”, conta (leia mais sobre a história dele ao lado).
A pesquisa é conduzida paralelamente à quinta revisão que a Associação de Psiquiatria Americana (APA) está promovendo no Manual Diagnóstico e Estatístico dos Distúrbios Mentais (DSM-V). Referência para médicos de todo o mundo, inclusive para o Brasil, o documento – lançado em 1952 e revisado pela última vez em 1994 – deve ser publicado em 2013 com cerca de 300 distúrbios psiquiátricos – entre eles os sexuais, que sofrerão mudanças.
“Em vez de impulso sexual excessivo ou compulsão sexual, o código americano vai alterar o nome para transtorno hipersexual”, diz Scanavino. O que muda, na prática, é que os critérios serão bem definidos. Para ser considerado portador de transtorno hipersexual, a pessoa terá de ter pensado muito em sexo nos últimos seis meses, ter tido muitos impulsos sexuais ou ter se comportado com relação ao sexo de maneira que o ato tenha trazido algum tipo de sofrimento para ela. “Não precisa necessariamente ter sido com outra pessoa. O sujeito pode estar sozinho em casa, assistindo a um filme erótico ou se masturbando. Se isso causar sofrimento ou comprometer outras áreas, como trabalho ou vida social, ele terá transtorno hipersexual.”
Coordenador responsável pelo Ambulatório de Tratamento de Dependentes Não-Químicos do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o psiquiatra Aderbal Vieira Júnior considera a adoção do termo ‘transtorno hipersexual’ superficial. “Transtorno só significa que algo não está funcionando bem”, afirma. Na avaliação dele, não há diferenças significativas entre a química cerebral desses pacientes e a de um indivíduo saudável. “O que essa pessoa faz com o ‘tesão’ que tem é que é diferente”, compara. “A maioria dos dependentes de sexo é de pessoas convencionais, só que elas têm mais descontrole.”
O ambulatório coordenado por ele já atendeu cerca de 200 casos, sendo 95% homens. “Eles estão mais ligados ao lado sexual e a mulher, ao afetivo”, compara Vieira Júnior. A idade média dos pacientes atendidos no local é de 34 anos. “Metade tem faculdade, boa parte tem pós-graduação e praticamente todos concluíram o 2.º grau”, detalha o psiquiatra.
As avaliações feitas até agora no levantamento do Hospital das Clínicas também indicam uma prevalência masculina entre os compulsivos sexuais: oito homens para uma mulher. “Na literatura, a mulher com compulsão sexual teria casos com frequência e não sexo casual, algo que o homem mais frequentemente tem”, explica Scanavino. “Mas o que temos observado até agora é que a diferença de padrão de comportamento não é tão grande assim.”
A pesquisa do Hospital das Clínicas já está adotando os novos critérios do DSM-V. “Queremos saber se os comportamentos hipersexuais se desencadeiam por eventos adversos ou por estados de humor negativos, sem levar em consideração a repercussão para outros envolvidos, outras áreas da vida da pessoa e a perda de controle”, conta. Os resultados preliminares devem ser divulgados ainda neste ano.
VERÔNICA DANTAS - Jornal da Tarde

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